terça-feira, 15 de abril de 2008

Com dor de cabeça eu não masco chicletes



Eu tenho andado tão sozinho ultimamente
Que nem vejo em minha frente
Nada que me dê prazer


Casinha Branca
Maria Bethânia






Essa dorzinha me incomoda.

Esse incômodo que vem junto com o mês de abril me abriu. Quero fechar, mas esse tilintar ecoa na minha mente. Beeeeeeeeeeeen. Nada me prende, ninguém me segura. Sigo em frente, atravesso a rua.

A pequena mulher sentada ao meu lado chora ou recorda, não sei ao certo.

_ O que lhe aflige, senhora? Pergunta a branquela simpática.

Ah, sim. Uma cirurgia. Que desagradável. Mas a branquela simpática a afaga, retira a preocupação de seu rosto, o vermelho de seus olhos, e se vai. E se vão. E nos vamos.

Agora sim, mais perto de casa e do fim desse sino que oscila no meu córtex. Mas não a paz, ainda não.

No lugar da pequena mulher, o menino magrela. No lugar da branquela simpática, cabelos negros como a noite sem luzeiros. Sobre as rodas eles giram a conversa, falam do cheque sem fundo, falam do dinheiro a mais na conta do outro. Falha no sistema. Dor nas têmporas. O gerente liga, o médico não chega, as rodas não chegam e essa conversa que se repete, e se repete interminavelmente como o mês de abril e como essa dorzinha que me incomoda.

Depois de tanto tempo já não recordo se o ponteiro das horas é o grande ou o pequeno. Pra dizer a verdade, todos os dois parecem minúsculos, inversamente proporcionais à essa tontura. Sim, está rodando. Os ponteiros, as rodas, o mundo.

Acho que cheguei, ou pelo menos parei.

Acho que me lembro, agora, com uma mão na caneta e outra na xícara de café, aquela ladainha me vem como uma goma de mascar que perde o gosto e não a forma, mas com dor de cabeça eu não masco chicletes.

Um comentário:

Darlan disse...

Quando li logo no início do texto a letra de Casinha Branca imediatamente coloquei aqui pra tocar, e comecei ler o texto. Não sei se me perdi na leitura ou um sei lá o que aconteceu, só sei que no ponto final notei um nó na garganta... e Bethânia ao fundo ecoando notas pedindo por uma casinha branca de varanda, com quintal e uma janela para ver o sol nascer...